quinta-feira, julho 16, 2015

Sobre saudade e contemplação

Algumas sensações que experimentamos ao longo da vida, são extremamente inquietantes e positivas.  O encontro com algumas pessoas faz-nos derramar, além de lágrimas, muito amor e encantamento. Encantamento frente à memória intacta. Amor à lembrança carinhosa.
Ultimamente, tenho andado um tanto saudosa e, com isso, meus pensamentos têm alçado voos distantes. Mas uma distância retrógrada, para o passado. Tenho revisitado lembranças, memórias intactas, sentimentos experimentados. Ando relendo cartas antigas, guardadas na "caixa de lembranças" e me afundado em itens que marcaram tantas épocas.
O tempo tem passado, realmente. Ele passa a todo o momento. Nunca parou. E por que será que nem sempre nos damos conta disto? Ele nos engana quanto a sua intensidade. Podemos senti-lo demorar, mas podemos notar sua pressa. Há horas que demoram uma eternidade e há dias que parecem uma hora. Levamos muito para perceber o quanto ele se antecipou. E aí, não há como reconsiderar.
Tenho experimentado, além de minhas lembranças, as memórias de pessoas queridas, por vezes mais conservadas que as minhas. E é incrível perceber que todos, de alguma forma, sentem-se prejudicados pela passagem do tempo.  É como uma ironia. Vivemos, vivemos, vivemos, mas há sempre o pesar do que não foi, do que não se concretizou. Fico preocupada com este tipo de atitude, dos outros e minhas também. Parece-me fundamental que compreendamos que viver é sempre uma questão de escolha. E que nossas escolhas estão sempre pautadas sobre o melhor que podemos fazer naquele momento. São temporais e contextualizadas. Sendo assim, não existiriam muitas justificativas para nos culparmos pelo que não fizemos ou pelo que achamos, atualmente, ser a melhor escolha. Já foi e aconteceu como poderia ser. Mas é tão difícil nos conformarmos, não é mesmo?
Dos últimos encontros, das últimas conversas, senti verdadeiramente que tudo é efêmero, que passa num piscar de olhos. No entanto, há um elemento que fica e que tem a função de conservar a nossa vida em longo prazo: nossa memória! E quão primoroso é o trabalho dela. Surpreendo-me com o poder de conservação dos detalhes e dos acontecimentos minuciosos.  Elas podem ser tão intensas, que em alguns momentos sentimentos as mesmas sensações vividas na situação real. Não é incrível?
E por mais saudosa que pareça, algumas lembranças não fazem mais sentido no presente. Quero deixar clara que esta distinção não é das mais fáceis, mas me pareceu muito justa: ao relembrar momentos passados, nem sempre o que sentimos é saudade. Às vezes, é apenas um ingênuo estado de contemplação pelo já vivido. E ao chegar nesta conclusão, devo confessar o imenso alívio que senti.
Relembrar tantos momentos vividos com alegria e encantamento, não pressupõe o desejo de que estes mesmos momentos voltem a acontecer. Assim... pura e simplesmente. Desejar que algumas situações voltem ao presente é como querer utilizar aquela peça de roupa que não cabe mais, ou sapato com quatro números a menos. Incompatível! Mas não é fácil, eu sei. Num piscar de olhos nos afundamos em lembranças e na equivocada tristeza de não viver mais determinadas situações. Por isso, considero a possibilidade de distinguir estas sensações como grande conquista do autoconhecimento.
E autoconhecimento implica – às vezes – na dolorosa aceitação; na libertadora compreensão; e na genuína possibilidade de saber o que mudar. Mas sem memórias, sem histórias, sem lembranças inquietantes não alcançaríamos tamanha compreensão. Cuidemos com zelo do nosso constructo, das nossas vivências. E que uma hora ou outra paremos para relembrar, para inquietarmo-nos.

Pois mais estranho que possa parecer, são das inquietudes que nascem grandes alívios!



Ps.: Texto de janeiro, concluído agora.





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