segunda-feira, julho 29, 2013

Além de nós

"Essa dor nunca vai passar, dói demais!"
Quem nunca ouviu uma frase como esta e se compadeceu de quem a dizia?
E mesmo ouvindo-a com toda caridade não pôde mensurar o peso que aquelas palavras carregavam. Difícil sentir tudo isso.
Já ouvi dizer que a dor do parto é a mais doída, também ouvi que a dor do primeiro tombo de bicicleta e da primeira transa são inesquecíveis. Dizem que a dor da abertura de um canal é incomparável, e que bater o dedo mínimo do pé em um móvel é alucinante.
Os conselheiros dizem que a dor de ver alguém amado partir é aguda, tinhosa, e que a solidão é agonizante. Uma mãe diz que sua maior dor é ver o filho sofrer.
Para um homem, dizem que a dor mais sentida, é a dor do fracasso.  E talvez para os mimados o que mais dói é a contradição.
São tantas dores, por diferentes causas, diferentes sensações e apenas uma certeza: não há dor maior.
Há a dor que se sente, tão única e puramente. Há apenas a dor que agoniza, que faz chorar, que dá náuseas e interrompe noites de sono. Que atrapalha sonhos e provoca medos. Há apenas aquela dor que os poetas dizem sentir no coração e aquela dor que os médicos dizem se alojar no corpo.
Não há dor mensurável; não há dor compartilhada; não há dor transferida e nem dor roubada. Há a dor aguda, egoísta, expansiva, às vezes cega e voraz.
Há a dor que podemos sentir. E aquela que tentamos ver.
Esbarramos em dores alheias que nos fazem repensar as nossas próprias. E oferecemos nossos lamentos para que o outro possa repensar os seus próprios. Falamos de dores para nos sentirmos próximos de um semelhante. Falamos de dores para nos igualar.
Dizemos que doeu para fugir. Mentimos a dor para fazer chorar.
Sorrimos para esconder a dor; gargalhamos para ela passar.
Às vezes ela se vai. Por vezes fica acomodada. Outras vezes permite-se ser expulsa. Algumas vezes não arreda o pé, é a última a sair.
Nesta tarde, talvez eu tenha visto a dor do corpo e do coração juntas, atreladas. Não era em mim, era externa, era num grão de gente que possui imensa humanidade.
Uma dor invasiva, ameaçadora.
Não pude compreender estava além de mim, além de você. Compadeci.

quinta-feira, julho 11, 2013

Sublime

Um simples piscar, um leve cochilo ou um momento sereno pode dar asas a inúmero pensamentos.
Num misto de fragilidade e ousadia ela atrai olhares diversos, interesseiros, admiradores. Sua maciez encanta, oferece calmaria, faz com que muitos se aproximem e ousem manuseá-la. Inofensiva, tímida e amedrontada cria defesas naturais, tão óbvias para si mesma que as enxerga como parte comum de sua essência. Decora jardins, mesas, festas, fotos. Durante a noite ou pelo dia. Promove encontros, surpresas, reconciliações. Machuca os dedos, busca ousadamente o vermelho amargo do sangue. Assim pude degustar o porquê da minha admiração pelas rosas, sobretudo as vermelhas, elas me encantam! Compreendi o mistério e o misto. Senti a intensidade e a leveza. Enxerguei a beleza e a fúria. Admirei a docilidade e a voracidade. Identifiquei-me sublimemente.



quarta-feira, julho 10, 2013

Monólogo (Quarto conto)

Um campo, uma árvore, a ventania.
Este era o cenário que dava berço a diversas tardes daquela garota. Aquelas tardes em que quietinha ficava sobre as raízes da árvore, ensimesmada.
Dali podia ver a linha do horizonte, marcada por aquele campo vasto. Podia sentir o vento dar um nó, bagunçando seus cabelos compridos, e o calor do sol fazer tremer a paisagem. Dali podia sentir-se, falar-se, amar-se e odiar-se. Tudo intensamente, timidamente, livremente... ela estava só. Ali estava o cenário perfeito, a paisagem de um quadro bonito, um foto intrigante e sublime.
 Minutos, horas, longas tardes, algumas manhãs, poucas noites. Esse foi o tempo em que a garota despendia naquele cenário. Tempos que lhe davam a oportunidade de sentir o sopro, não do vento, mas de si mesma. Um sopro inquietante, daqueles que tira o ar por um tempo, que conserta e desconserta, que compõe e descompõe. Podia sentir o pulsar de seu coração e o ritmo que tocava. Ela era pequena aos olhos do outro, pouco lhe levavam a sério. Menor parecia naquele campo, mas nunca deixava de sentar sob a árvore.
Os anos passaram, muitas copas da árvore foram trocadas. Muitos outonos e primaveras foram vividos, no entanto, ela nunca deixara de visitar seu cenário preferido e contemplar suas cores, que pareciam diferentes a cada estação. Para ela o tempo também passava e junto desta passagem sentia que suas cores também mudavam, ora reluzentes, ora opacas.. aprendia a lidar com elas.
Não era mais um garotinha, estava no momento em que todos lhe pareciam incômodos demais. Essa foi a época em que mais visitou seu cenário. Fora uma época em que o vento parecia mais turbulento, o horizonte mais distante e as raízes da árvore pouco confortáveis. Mas permaneceu ali, constantemente.
Na verdade pouco entendia por que frequentava aquele campo. Sabia que ali se sentia calma, mas também sabia que todo aquele silêncio lhe causava muita irritação, e nesses momentos lançava pedras com mais força, como numa tentativa de expulsar o que lhe incomodava. Mas não era a pedra, ela sabia.
Durante um tempo pensou em abandonar aquelas visitas, havia cansado de encenar aquele monólogo e tinha enjoado daquele cenário.
Continuou crescendo, os anos difíceis de rebeldia tinham sido superados. Outros conflitos lhe eram propostos, outras pessoas lhe afetavam, seu olhar era mais intenso. Tudo estava mudado, sentia saudades daquele cenário, aquele campo, aquela raiz incômoda. Enfim, revisitou seu lugar, aquele que passara tanto tempo há anos atrás.
Tomou coragem e reviveu sensações intensas e organizou suas novas percepções, medos e angústias. Ela estava sob a árvore que agora lhe parecia menor do que de costume, tinha pedras na mão como sempre fizera. Era uma tentativa de se encontrar novamente, poder conversar consigo mesma. Voltou a soltar palavras ao vento e mesmo que ele as levasse para longe, dentro dela elas pareciam voltar tratadas e mais ricas de sentido. Adorava falar para si mesma e para o horizonte. Sentiu novamente o vento bater em seu corpo e seus medos se arrepiarem. Gostava daquela sensação, daquela solitária sensação de estar consigo mesma. Sentiu por não poder frequentar aquele lugar como antes o fazia; sentiu por não poder sentir-se, falar-se, amar-se e odiar-se como antes...
Ali, naquele campo, pôde entender o real sentido de todas suas visitas solitárias e a vontade de sempre voltar até lá. Descobriu que havia uma forma de organizar-se, mesmo que aparentemente, e era assim, na sombra da árvore, sob as nuvens andantes.
Lamentou profundamente por não poder estar mais ali, deixou-se rolar uma lágrima. O céu já estava escurecendo, o sol já havia se posto. Era hora de ir. Voltar para o mundo que não é só seu, que é de tantos outros. Levantou-se e despediu-se daquele lugar que a colocava de frente com alguém que lhe era tão familiar, ela mesma.
Andou passos calmos, pesados e lentos, distanciando-se do palco de seus monólogos. Quando longe estava, fitou aquela paisagem para não esquecê-la posteriormente. Queria aquele lugar sempre em sua lembrança. Já distante, mas não menos pensativa, percebeu que aquele cenário se fazia vivo a cada momento em que se propunha estar consigo mesma. Percebeu que era capaz de fazer viva aquela árvore, mesmo que fosse em outro lugar.
Entendeu que o tempo todo aquele campo representava o tempo, vasto e mutável; aquele vento seus pensamentos, que ora eram calmos, ora avassaladores; e aquela árvore era ela mesma, uma garota, uma moça, uma mulher.
Aquele lugar agora lhe fazia sentido. Talvez ele nunca tivesse existido; muito provavelmente ele nunca existiu.
Era sempre ela. Somente ela. Buscando, em sua condição de árvore, encontrar um vento que lhe podasse calmamente, que suavizasse a transformação.
Era ela, seu próprio palco: o campo, a árvore e a ventania.












segunda-feira, julho 08, 2013

Uma pausa: a saudade...

Há muito tenho notado que por diversas vezes em uma mesa de bar, uma roda de amigos, a dois ou sozinha,  me pego divagando acerca do que é a Saudade.
Como quase todas as coisas na vida, esse é mais um elemento que utilizamos em nossas conversas, nossas juras de amor, nossas declarações, nosso dia a dia e que pode ter um significado muito particular para cada um.
Talvez o meu conceito de saudades distancie-se do seu, e estes conceitos difiram de um terceiro. Eis a dúvida: será que todos sentimos saudades?
Talvez sim, talvez não. Torna-se quase impossível responder a esta questão,  visto que cada um tem um modo muito particular de viver e se relacionar com o mundo. E esse modo de funcionamento tão particular, que faz alguém sentir ou não saudades. Acredito nisso!
Possivelmente muitas variáveis devem ser observadas se quisermos analisar a saudade. Desde a forma como nos relacionamos com alguém/algo, o momento em que esta relação acontece, o produto desta relação, até o que este elemento representa. Ao discriminar tudo isso, fica evidente a tarefa desafiadora que estou tentando me aventurar, agora.
Não quero que este texto esgote todas as possibilidades acerca da saudade, longe disso, quero apenas me arriscar em algo que me intriga o suficiente para dissertar.
Coração apertado, vontade de ter próximo, idealizações, lembranças recorrentes, falta da presença, essas são sensações características do que eu intitulo como Saudade. Devo dizer que tudo isso pode estar relacionado a falta de uma pessoa, um animal, bem como um objeto, visto que durante a vida nos relacionamos com muitos objetos que devotamos grande representação, e é extremamente normal que sintamos falta de algo inanimado.
É importante atentar-se ao fato de que muitas coisas deixam saudade justamente pelo momento em que elas foram experenciadas. A latente necessidade (privação) de algo, o torna tão mais atraente e necessário, de modo que em momentos similares a esta privação, dizemos que precisamos disso, em outras palavras... que estamos com saudades. É possível que esta comparação tenha sido um pouco radical, e que a a necessidade de algo não seja sempre geradora de saudade, mas provavelmente a saudade seja a estranha e avassaladora vontade de ter algo.
Percebi também, que com a passagem do tempo e consequentemente, com a mudança de nosso ambiente, algumas coisas que antes não tinham grande significado, passam a fazer grande falta. É como aquela velha sensação narrada pelos idosos: "Eu era feliz e não sabia! Que saudade daquele tempo!". Isso deixa claro que estamos sujeitos a sentir saudades de coisas que atualmente julgamos pouco importantes.
Ah! Mas que complexo tudo isso!
O que será a saudade, afinal? Será um sentimento, um estado, uma sensação?
Quem saberia responder?
Poetas tentam a todo momento, rabiscam versos e compõem músicas. A sentem latente e pulsante e até ousaram dizer que sentem saudades do que não viveram. Adolescentes dizem senti-la a todo momento estranha e deliberadamente, queixando-se da falta de diferentes coisas e pessoas.
Eu ouso rabiscar meus pensamentos e traduzi-los neste apanhado de palavras, pouco conclusivas e talvez errôneas, mas minhas. Busco entender o que me causa saudades e como lidar com elas. Da mesma forma, busco compreender a saudade do outro e como ele a sente, será que a sente? Algumas pessoas parecem não senti-la, ou somente não a expressam.
Veja bem, são tantas perguntas, poucas respostas.
Devo dizer que a sinto, algumas vezes. E ela arde como brasa, queima algo que não sei bem o que é, e se apaga, às vezes logo, às vezes tarde. Sei também que algumas me são passageiras, rápidas e efêmeras. Algumas tão  intensas que parecem insaciáveis, de modo que mesmo entrando em contanto com o que a causa, ela parece se multiplicar, é como querer mais, mais e mais um pouco. Neste último caso talvez nem seja saudade. O que poderia ser então... amor? Ah! Este é um assunto para outra prosa, outras divagações, outros drinks... Quero me ater agora somente a saudade... Essa que não tem tradução, mas que não existe somente para nós. Essa que acomete crianças, adolescentes, adultos ou idosos. Essa que nos torna saudosistas, chatos e repetitivos. Essa que incomoda, mas ao mesmo tempo parece ser algo delicioso de ser vivido. Essa que me parece charmosamente complexa e que me pego pensando... ou sentindo.
Essa que me faz pausar. Suspirar. E pirar.
Quero senti-la... Mas não posso ser egoísta...
Por isso...

Te convido agora a divagar: você sente saudades?
















quinta-feira, julho 04, 2013

Não uma, mas duas




Sem muitos protocolos tenho a ousadia de me comparar a uma moeda. Me soa semelhante demais a posse de duas faces, não dois Eus (talvez, quem sabe?!), mas duas facetas que vivem em intensa colisão.
Cara e Coroa para as faces das moedas, já as minhas não foram nomeadas, nem há necessidade para tal, - parece-me ilógico demais poder chamá-las por um nome se até pouco tempo nem me eram conhecidas. Com todas as ressalvas possíveis, estabeleço semelhanças entre minhas facetas e das moedas, estas últimas são possuidoras de diferentes características duais: podem ser boas e ruins, influentes ou com pouca influência, ter valor alto ou baixo valor, etc. Devo dizer que compartilho também de toda esta ambivalência, à minha moda, é claro, mas de modo muito próximo. É sabido que o dinheiro pode, por muitas vezes, favorecer acontecimentos muito bons, no entanto, pode prejudicar muitas relações. Dessa mesma forma,  entendo como posso a partir de minhas atitudes protagonizar boas situações, bem como ter atitudes detestáveis. Sim, enxergo em mim a possibilidade de fazer mal ao outro, vejo em você também, fazemos com ou sem consciência disso.

Como na realidade monetária, vejo dias em que tenho mais valor e dias que meu valor está bastante reduzido, tão capitalista isso, não?!

Não! Enxergo claramente as situações em que meu valor é latente e momentos em que simplesmente tanto faz. Fato este que implica diretamente no quão influente podemos ser, assim como o dinheiro e toda a sua representação mundial. A depender de seu valor uma moeda pode cruzar fronteiras, integrar idiomas e realizar grandes transações, dessa mesma forma, entendo que a depender do valor que represento para algo ou alguém me torno mais ou menos influente sobre.

Mas para além das moedas, quero me ater a outro tipo de dualidade que vivencio. A colisão constante que sinto acontecer e posso ver os resultados ao final, mas sem muito saber como acontecera.
Não espero sua compreensão a respeito disso, tentarei tratar de mim mesma de um modo bastante simples, não que o seja, mas dessa forma minimizo o estranhamento desta realidade.
Outrora, em um momento de alívio após uma escolha realizada com sucesso, atentei-me ao que antecedera a esta escolha: era ela, a dúvida. Não que ela me fosse estranha ou pouco sentida, mas dessa vez ela me ocorreu diferente. O passo seguinte foi entender o que causava esta dúvida. Não obtive muito sucesso em busca desta resposta, no entanto, entendi que até o momento de executar um fato já decidido tendo a derrapar nesta decisão, visto que outras opções apresentam-se mais apetitosas.
Posteriormente pude perceber claramente que para executar, de fato, a primeira decisão, era necessário que uma de minhas facetas fosse irredutível, forte e destemida. Assim, compreendi que meus anseios eram dinamizados a todo momento por mim mesma e dei luz à consciência de minhas duas faces: a que decide o que fazer mas logo sabota a si mesma e a que a todo momento prioriza a escolha primeira.
Que caótico! Talvez para você eu tenha me distanciado da analogia às faces da moeda, penso que sim, também. Mas entendo que a força proponente de minhas faces torna-me um ser humano em ebulição, e isso merecia ser dito, possivelmente como forma de deixar evadir um pouco desta fumaça que me sufoca.
Vejo também a possibilidade de melhor compreender a dinâmica destas duas faces, de modo que uma está o tempo todo tendo de apertar os cintos, fechar as portas, cerrar os dentes por conta da inconsistência de sua parceira. Em suma, devo dizer que uma necessita da pressão e cuidado da outra. Isso acontece para que a primeira possa tornar real sua decisão, sem medos, comodismos ou insegurança. É como uma criança que quer escorrer em um brinquedo, mas deve subir todas as escadas, diante do medo pensa em desistir, no entanto alguém de fora lhe ajuda e encoraja, dizendo que o resultado final será bom. Sem a força deste ambiente talvez as escadas tivessem barrado seu desejo.
E a cada alívio tenho certeza de que a pressão exercida obteve sucesso e eu pude desfrutar da minha vontade mais pura, original. Caso ocorresse o contrário teria, ao final, a sensação mais assustadora da vida: "E se...".
Por entre ebulições e evasões, busco dinamizar todas estas dualidades e colisões que me ocorre diariamente. Às vezes obtenho sucesso, por vezes me pego sussurrando:
...e se...

Quem sou eu

Minha foto
A mesma de sempre com inúmeras alterações.